sábado, 7 de fevereiro de 2015

Capítulo III




 A Floresta de Santalune. Suas árvores cobriam a visam do que havia após elas, canalizando a atenção para o refúgio natural como um buraco-negro que absorve a luz ao redor. Diversos pokémons faziam daquele lugar sua moradia, em sua maioria do tipo Inseto. As trilhas eram estreitas para os humanos, mas havia um espaço bem mais amplo a ser explorado por aqueles que conseguiam se embrenhar pela mata densa.
 -Mano, que lugar incrível! - exclamou Draco, percorrendo seu entorno com o olhar – Olha quanto lugar para explorar!
 -Curioso e irrequieto. - constatou o Fletchling, quase que uma nota mental feita em voz alta – Boas características para um explorador, mas não quando se está em um labirinto natural.
 -Bem, o único jeito de sair de um labirinto é andando por ele, tentando os caminhos até achar o certo. - defendeu a raposa – Seu argumento é inválido!
 Felipe quase rebateu dizendo que havia maneiras mais estratégicas de vencer um labirinto, mas percebeu que ele não aceitaria aquilo – e a resposta dele não deixava de ter certa lógica, no final das contas. Até porque, tinha uma resposta melhor.
 -Continua inválido se eu disser que já estive por aqui algumas vezes e tenho mais chance de conhecer o caminho certo do que você?
 Ele chegou a abrir a boca, mas, como nenhuma frase lhe veio à mente, se limitou a manter-se calado. Não por muito tempo, porém.
 -Mas então, você nem contou ainda porque topou vir. - falou de maneira casual, colocando as mãos atrás da cabeça enquanto caminhava
 -Digamos apenas que tenho um desafio a cumprir. - ele disse simplesmente, ajeitando os óculos
 -Mais motivado impossível! - exclamou o Fennekin, com um sorriso – Sabe, também não é à toa que quero que essa guilda seja a melhor. Eu disse que assim seria para meus amigos. E eu não volto atrás com algo que disse para eles.

 Já estavam caminhando pelas trilhas há algum tempo, e talvez já estivessem além da metade do caminho. O loiro não ficava mais do que cinco minutos calado, mas estava em um de seus raros momentos de quietude. Estava a ponto de quebrá-lo novamente quando a dupla percebeu um movimento logo à frente. Pararam de andar de maneira automática, e os autores do barulho não demoraram a se revelar.
 Era um trio, composto por uma garota, que parecia a líder deles, e dois garotos mais novos, quase idênticos. Ela tinha sagazes olhos negros e um curto cabelo da cor de terra batida, mesmo matiz de sua cota de malha e calça, e havia uma zarabatana pendurada em seu cinto. Os dois menores tinham o cabelo verde e grandes olhos amarelados, vestiam camisetas verdes de detalhes amarelos, mesmos tons dos shorts, e pareciam carregar algo às suas costas, visto que seguravam uma corda branca como segurariam a alça de uma mochila.
 -Até que enfim! - exclamou o Fennekin – Estava sentindo falta de um pouco de ação.
 -Não gostamos de intrusos por aqui. - rosnou a líder do trio – Principalmente acompanhados de treinadores.
 O Flecthling ainda ia argumentar, tentando manter uma aproximação diplomática, mas a raposa já tinha feito sua decisão, como seu sorriso mostrava.
 -Bem, se é uma luta que querem...
 Suas mãos já estavam em chamas, e, quando os adversários entraram em posição de guarda, demonstrando que tinham aceitado o desafio, não hesitou em disparar. Os três rapidamente desviaram, cada um pulando em uma direção diferente. Draco decidiu focar na Weedle, atirando mais e mais bolas de fogo, em sua maioria sem uma mira precisa.
 -Você já ouviu falar em alvo? - seu parceiro o repreendeu, mas nem esperou resposta, visto que a dupla de Caterpies o alcançara e realizavam suas investidas
 O Fennekin fingiu que nem tinha ouvido, prosseguindo na mesma estratégia – ou seja, sem estratégia alguma. Contudo, não obteve um bom resultado. Pokémons Inseto são conhecidos por sua velocidade, e ela fazia jus à fama. Em um momento, chegou a acertá-la de raspão, ao que ela sequer deu sinal de se importar com a queimadura. Logo estava em cima de uma árvore, com uma zarabatana apontada em sua direção. Apressou-se em desviar dos dardos, sabendo que provavelmente estavam envenenados.
 Felipe não estava tão melhor. Apesar de não haver o perigo de envenenamento com seus adversários, ambos estavam determinados a prendê-lo em suas redes pegajosas e resistentes. Tinha sorte por ser ágil e ter o vento a seu favor.
 E, falando em ar... Algo estava muito errado nele. Afinal, a cada respiração, parecia mais cansado do que reenergizado. E não demorou a descobrir o porquê. Seus adversários também não – ou melhor, não demoraram a sentir os efeitos. Até mesmo o causador daquilo já estava tossindo, começando a ficar sufocado.
 Afinal, um princípio de incêndio os rodeava. Com todos os seus ataques descordenados em um meio altamente inflamável, Draco tinha criado um pequeno inferno, que logo se espalharia. E, antes, os levaria a perdição graças ao calor e à fumaça.
 Um dos Caterpies já tinha caído no chão, fraco a ponto de desmaiar, quando uma sutil mudança foi sentida no clima. E não demorou para que o frescor natural da floresta voltasse a ser sentido, com as chamas sendo gradualmente controladas e apagadas. Quando apenas cinzas restavam, puderam ver seus salvadores. Três rapazes com armas de água os circundavam, expressões leves apesar do ocorrido. Suas roupas eram de tom bege claro com detalhes em azul claro, essa última tonalidade também presente em seus cabelos. E eles logo reuniram-se ao redor de uma mulher, cujo vestido era constituído de muita seda, lhe dando um volume excessivo, e preenchido por várias coisas coloridas, como se tivessem se agarrado a ele ao entrar em contato.
 -Bem, o que temos por aqui? - questionou ela, sua voz demonstrando que não estava muito paciente
 -Intrusos causando problemas! - a Weedle se apressou em responder, apontando para a dupla recém-chegada
 A mais velha deixou um forte suspiro de enfado escapar, como se não estivesse surpresa.
 -Por que esses novatos sempre tem que arrumar problemas aqui... - pensou alto, logo voltando-se para eles – Escutem bem. Vou tentar não ser tão dura com voc...
 -Hey, foi mal. De verdade. - Draco interrompeu-a, tentou desculpar-se – Não estavamos procurando encrenca...
 -Pois para mim você parece um moleque bem encrenqueiro! - esbravejou a Spewpa – Afinal, o que você, um incendiário em potencial, tinha na cabeça passando por uma floresta?
 -É o caminho para o primeiro ginásio. - justificou-se
 -Você está querendo montar uma guilda, então? - ao que ele assentiu, ela deixou uma risada ecoar seu desprezo – Pois tomara que não consiga! Um garoto irresponsável como você não serve para líder!
 Aquelas palavras, jogadas na sua cara com aquele tom, foram suficientes para fazê-lo inflamar de novo. Porém, antes que algo mais queimasse, um dos guarda-costas o atingiu, e dessa vez o jato d'água foi mais forte, o bastante para derrubá-lo. A Spewpa ainda riu uma vez mais quando a raposa se ergueu de cabeça baixa.
 -Draco Scarlet. - murmurou ele, uma sombra cobrindo seus olhos – Guarde bem esse nome, você ainda o ouvirá ser aclamado como um dos novos Campeões. Porque eu prometi aos meus amigos que seria o melhor, e eu não volto atrás com a minha palavra.
 O Fennekin, completamente encharcado – tanto que sua roupa e seu cabelo ainda pingavam –, deu meia volta e começou a se afastar do grupo. Seu companheiro de viagem ainda hesitou por um momento, mas logo seguiu pelo mesmo caminho. E, ao longe, olhos negros fitavam os dois garotos, e um singelo sorriso apareceu naquele rosto.

 Draco há pouco ultrapassara a fronteira da floresta, e ainda permanecia em silêncio. Mesmo que o Fletchling o conhecesse há bem pouco, conseguia deduzir que isso não era bom sinal. Ele sentou-se em um canto um tanto afastado da rota pouco depois de seu caminho voltar a ser terra batida e grama baixa, o resto da água ainda presente em seu corpo evaporando devido ao calor que o próprio produziu. A ave estava a ponto de falar com ele quando ouviu o sutil barulho de um galho quebrando. Automaticamente virou-se para trás, encontrando-se com um vulto que logo se escondeu atrás de uma das árvores.
 -Há alguém nos seguindo. - comentou
 -Dispenso mais um sermão. - resmungou Draco, embora alto o bastante para ser entendido
 O vulto, ao ouvir aquilo, saiu de seu esconderijo e aproximou-se, ainda que com passos hesitantes e as mãos nas costas. Uma garota de ralos cabelos loiros, vestida com uma blusa amarela e uma saia rodada de mesmo tom com detalhes em marrom. Sua expressão denotava nervosismo, e ela parecia estar se esforçando para manter-se a vista e não sair correndo.
 -E-eu não vim para te dar um sermão. - gaguejou ela, um leve sorriso aparecendo em seu rosto ao prosseguir – Vim só dizer que admiro muito quem é tão determinado em realizar um sonho. E acho que você vai conseguir sim montar uma guilda muito forte.
 O garoto já tinha se virado para ela, mirando seus gentis olhos negros. E, ao que ela terminou de falar, não pode evitar abrir um sorriso também.
 -En-então, era só i-isso... - murmurou a Pikachu, já girando nos calcanhares
 -Espera! - exclamou ele, colocando-se de pé e indo até ela, impedindo seu movimento ao segurá-la pela mão – Obrigado mesmo. Era o que eu precisava ouvir.
 A garota, ainda que completamente sem jeito e barbaramente corada, conseguiu gaguejar um “de nada”.
 -Aliás, qual seu nome? - indagou ele
 -Pa-paulline...
 -Paulline? É um belo nome. - elogiou, conseguindo outro sorriso – Então... Quer entrar em uma guilda?
 O olhar dela faiscou, se iluminando com a perspectiva, mas ela logo baixou o rosto, sua insegurança sendo mais forte.
 -Mas eu... eu não...
 -Não faz parte de uma ainda, né? - Draco cortou sua fala, decidido – Então, acho que não tem nada te impedindo de se juntar a nós.
 A Pikachu o fitou, aquele brilho voltando a sua expressão. Sempre esperou por um momento onde sua insegurança pararia de gritar em sua mente, lhe dizendo que nunca sairia daquela pequena floresta. E de repente esse momento estava ali, materializado naquele Fennekin de sorriso tão adorável.
 -Tem razão. - afirmou, pela primeira vez sem gaguejar ou hesitar
 Draco expandiu ainda mais o sorriso, em seguida a puxando – visto que ainda a segurava pela mão – até onde estava o Fletchling.
 -Acho que não temos mais problema quanto ao número de integrantes, né? - comentou
 -Não mesmo. - respondeu, voltando-se para a nova integrante – Meu nome é Felipe. E esse é o …
 -Draco Scarlet. - ela completou – Eu gravei o nome.
 A raposa não pode evitar se sentir contente ao ouvir como ela prestou atenção no que dissera. Se há pouco estava realmente mal humorado, aquilo já era passado. Sua costumeira personalidade animada tinha voltado.
 -Eu... posso me despedir de uma amiga? - indagou a garota de repente – Prometo que não demoro.
 -Claro, à vontade!
 Assim que o Fennekin deu-lhe assentimento, a Pikachu se afastou, seguindo pela trilha em direção à floresta.
 -Então, o que achou dela? - perguntou Draco, voltando-se para o parceiro, que permanecia com aquele olhar observador
 -Eletricidade. É um ótimo poder. - comentou ele – E a espécie dela é conhecida por sua velocidade. Acho que formamos uma boa equipe.

 A Pikachu não parou nem por um segundo, mais animada do que jamais estivera em sua vida. Vez ou outra, escalava uma árvore e se perguntava como seria a vida lá fora, como seria desbravar todas aquelas rotas. Porém, sempre havia a voz da insegurança na sua cabeça, a desmotivando. Ou ainda, alguém lhe dizendo que entrar numa guilda não prestava – esse era o caso de sua melhor amiga, e sabia que ela não aprovaria sua decisão. Só que, naquele momento, nada disso importava. Estava livre para sonhar e para realizar seu sonho.
 -Liesel? - chamou, chegando ao local onde ela geralmente ficava
 Logo viu movimento em meio às folhas, e aquela que chamou apareceu. Ela era da mesma espécie, mas mais alta e de expressão mais séria e decidida, um reflexo da diferença entre suas personalidades. Liesel era altiva, gostava de treinar, e havia certo brilho de mágoa em seu olhar. Sua determinação era um motivador para Paulline, que desejava ser como ela. E agora cumpriria esse desejo.
 -O que foi, Line? - perguntou a amiga, chamando-a pelo apelido
 -Eu...
 Hesitou. Sabia que ela desaprovaria, e muito, sua decisão. Mas já tinha a tomado, e não recuaria.
 -Eu estou saindo da floresta. - contou, sem gaguejar – Estou me juntando a uma guilda.
 Aquele brilho magoado tomou força, tornando-se uma tempestade. A expressão de Liesel foi tomada pela raiva.
 -Como é? Uma guilda? - ela tentou argumentar alguma coisa, mas a amiga não lhe deu chances – Você sabe que elas são sempre guiadas por humanos, não sabe? E você sabe o que penso deles, não sabe?
 -Sim, mas... Nem todos são assim! - protestou – Já pensou que o mundo é bem mais do que essa floresta? Sei que não me entende... Mas eu preciso ir.
 -Então vá! - bradou ela, em tom irado – Mas não diga que eu não avisei!
 Dito isso, Liesel lhe deu às costas, extremamente chateada. A garota deixou um suspiro escapar, cabisbaixa. Sabia que sua decisão magoaria a amiga. Porém, aquele Fennekin a inspirou a finalmente seguir com seus sonhos, sem olhar para trás, sem duvidar. Então, em uma última aproximação, alcançou-a e lhe deu um abraço, mesmo que a garota nem tenha reagido ao contato.
 -Adeus, Liesel. - murmurou – Você sempre será minha melhor amiga e minha ídola... Mas eu tenho que fazer isso. Espero que me perdoe algum dia.
 Ao terminar de falar, soltou-a, voltando para a trilha que a levaria para o resto do mundo. Sem olhar para trás.

Um comentário:

  1. Geeeeente, a Paulline parece ser uma fofa! Adorei ela! *O*
    E o capítulo ficou bem legal, Anne! /o/
    Espero por mais!

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